Testar todas as pessoas HIV-positivas para carga viral é uma prioridade de saúde

O vírus HIV é um retrovírus e infecta as células que apresentam a molécula CD4 na superfície, linfócitos T helper emonócitos. A infecção pelo vírus HIV possui um curso crônico e associado às diversas manifestações da imunodeficiência, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS). Nos últimos anos, a utilização de PCR em tempo real melhorou substancialmente o desempenho de detecção quantitativa de ácido nucléico (carga viral).
Desde meados da década de 1990, através do estudo multicêntrico AIDS Cohort Study (MACS) ficou demonstrado que aquantificação do RNA do HIV-1 é considerada o marcador laboratorial mais adequado para o estabelecimento do prognóstico de indivíduos infectados, para o monitoramento da resposta terapêutica aos antirretrovirais (ARV) e avaliação da progressão da doença. A carga viral plasmática, detectada na forma de RNA do HIV, reflete a dinâmica desse vírus nos indivíduos infectados, quantificando as partículas que estão sendo produzidas e lançadas na circulação sanguínea. Com
base nessas quantificações, sabe-se que níveis altos de RNA plasmáticos estão associados à queda rápida na população delinfócitos CD4 e à progressão mais rápida para AIDS.

A replicação do HIV

O principal receptor para a entrada do HIV-1 na célula do hospedeiro é o linfócito TCD4+. Embora as células TCD4+ pareçam ser o principal alvo para o HIV, outras células do sistema imune com moléculas CD4 em suas superfícies também são infectadas. Entre elas estão os monócitos e macrófagos, que podem hospedar grandes quantidades de vírus. Por ação da transcriptase reversa do vírus, no citoplasma da célula, a fita de RNA serve de molde para a transcrição reversa de duas fitas complementares de DNA viral (cDNA). O cDNA viral (de fita dupla) é transportado para o núcleo, é incorporado ao genoma da célula hospedeira pela ação da integrase e passa a ser denominado provírus. Para que o DNA proviral produza novos vírus, cópias
de RNA devem ser feitas.

Investigação diagnóstica

O manual técnico para o diagnóstico da infecção pelo HIV em adultos e crianças (2018) é última diretriz brasileira. No manual podem ser encontrados os fluxogramas com as opções de testagem disponíveis. As técnicas preconizadas pelos algoritmos de investigação da infecção pelo vírus HIV são os métodos sorológicos e de biologia molecular do tipo PCR Qualitativa (Reação em Cadeia da Polimerase), bem como os testes rápidos indicados em situações específicas. Na última edição, foram mantidos os fluxogramas 3, 4 e 5 que utilizam testes moleculares como testes complementares e alterado o
fluxograma 6 (Imunoensaio de 4ª geração seguido de western blot, imunoblot ou imunoblot rápido como teste complementar). Seguem anexados a esse informativo, pois permitem o diagnóstico seguro da infecção no ambiente laboratorial. A técnica de PCR qualitativa é empregada para:
– Detectar o HIV-1 antes da soroconversão (no período de janela; 3 a 8 semanas após o contagio)
– Fazer a confirmação de um teste de triagem reagente ou um Western Blot indeterminado;
– Avaliar a presença da infecção em crianças de mães portadoras do vírus HIV.
A determinação da carga viral para o HIV é obtida através da técnica de PCR-RT (tempo real) quantitativa e se destina a monitorar a infecção pelo HIV, orientar o tratamento e prever a evolução futura da doença.
A rápida elevação da viremia na fase aguda da infecção pelo HIV-1 ultrapassa os limites de detecção dos testes usados para quantificação, ou seja, alta carga de vírus.

História Natural da Infecção pelo HIV

A infecção aguda ocorre nas primeiras semanas após o
contagio. A viremia plasmática alcança níveis elevados e o
indivíduo é altamente infectante (linha cinza). Inicialmente,
ocorre queda importante da contagem de LTCD4+, com
elevação em algumas semanas (após certo controle
imunológico sobre o vírus), mas não há retorno aos níveis
iniciais (linha preta).
Na fase de latência clínica, o exame físico costuma ser
normal, a contagem de LT-CD4+ permanece > 350
cels/mm3, com infecções semelhantes às da população
imunocompetente. O aparecimento de IO e neoplasias e
definidor de aids. Se a TARV não for instituída,
inevitavelmente o indivíduo evolui para a morte.

Os vários ensaios de PCR, especialmente Abbott Real Time HIV-1 e COBAS Ampliprep/COBAS TaqMan HIV-1 assay, são ultrassensíveis para a quantificação do RNA do vírus HIV-1, mas diferem quanto a componentes do método (sistema de extração, primer e design de probe). O monitoramento da carga viral de um indivíduo deve ser na mesma plataforma de testes para assegurar uma interpretação adequada de qualquer oscilação significativa na carga viral.

Considerando-se que podem ocorrer variações do número de cópias/mL que não são significativas, é fundamental que o clínico saiba quais são as variações significativas da carga viral de um indivíduo e o que são variações intrínsecas das técnicas. Para se determinar se uma variação é significativa ou não, o primeiro passo é converter o valor absoluto de número de cópias/ml para logaritmo de base 10 (log10). Feita a conversão, um valor de logaritmo pode ser comparado com outro valor de logaritmo de um exame anterior do mesmo indivíduo.
As oscilações entre dois resultados de exame de carga viral menor do que 0,5 log10 (ou 3 vezes em relação ao valor anterior) não são consideradas significativas do ponto de vista clínico.

Possíveis resultados, acompanhados da escala logarítmica e observações do laudo

a) Resultado > 5.000 cópias/mL: “Resultado de quantificação da carga viral > 5.000 cópias/mL é presuntivo de infecção pelo HIV. A soroconversão deverá ser confirmada em nova amostra, obtida 30 dias após a data da coleta desta amostra”.

b) Resultado < 5.000 cópias/mL: “Amostra indeterminada para HIV. Persistindo a suspeita de infecção aguda pelo HIV, uma nova amostra deverá ser coletada 7 (sete) dias após a data da coleta desta amostra e submetida a um teste molecular”.

c) Resultado inferior ao limite de detecção do teste molecular: “Amostra com carga viral do HIV-1 não detectável. Persistindo a suspeita de infecção aguda pelo HIV, uma nova amostra deverá ser coletada 7 (sete) dias após a data da coleta desta amostra e submetida a um teste molecular”.

Manifestações clínicas, tratamento antirretroviral (TARV) e carga viral

O exame físico costuma ser normal na fase de latência clínica, exceto pela linfadenopatia. Enquanto a contagem de linfócitos TCD4+ permanece > 350 células/mm3 , os episódios infecciosos mais frequentes são geralmente bacterianos. Com a progressão da infecção, apresentações atípicas das infecções, resposta tardia à antibioticoterapia e/ou reativação de infecções antigas começam a ser observadas. O aparecimento de infecções oportunistas e neoplasias marca a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. A contagem de T CD4+ está, na maioria das vezes, abaixo de 200 células/mm³. Embora a carga viral plasmática apresente uma redução significativa após a fase de infecção aguda, a ativação imune persiste no estágio crônico da doença. O objetivo da TARV é ter uma carga viral muito baixa (indetectável) e uma contagem de células CD4 alta. O alvo da TARV é a manutenção de um limiar inferior a 1000 copias/mL, baseando-se em duas cargas virais, em 12 meses.

Relação entre Linfócitos CD4 e Carga Viral

Como os valores elevados de carga viral parecem estar relacionados com um maior risco de progressão da doença, independentemente da contagem de células TCD4+, é recomendado que os dois exames sejam realizados simultaneamente. Existe uma grande variabilidade inter e intra-individual, portanto, a decisão de tratamento se baseia em dados clínicos e laboratoriais. No Brasil, tem sido indicado o tratamento para pacientes com contagens de células TCD4+ abaixo de 500/mm3 e/ou com carga viral acima de 10.000-30.000 cópias de RNA/ml.
Diferentes tipos celulares podem atuar como “reservatórios de infecção silenciosa”. Segundo divulgação de pesquisadores, esse é um grande desafio, pois não se sabe exatamente quais células compõem o reservatório, onde estão e se são diferentes em pessoas diferentes. Alguns testes têm sido desenvolvidos para essa finalidade.

Quando solicitar a avaliação da carga viral e interferentes

  • Em períodos sem intercorrências clínicas.
  • Pelo menos 1 mês após uma infecção oportunística ou vacinação.
  • A cada 3-4 meses para avaliar resposta ao tratamento. Se ocorreu uma mudança na terapia ARV pode ser feita em período mais curto, de 1 a 2 meses.
  • Está descrita a associação entre fumo e álcool com menor CD4, maior carga viral.
  • Mutações no vírus são causa de falso-negativo nas cargas virais mais baixas.

Importante: em caso de amostras de gestantes com resultado reagente ou indeterminado, após a conclusão de um fluxograma, recomenda-se a realização imediata da quantificação da carga viral do HIV-1, com o objetivo de complementar o diagnóstico da infecção pelo HIV.

Carga viral e transmissão

Uma grande variedade de fatores comportamentais e biológicos está associada com o risco de transmissão, incluindo a freqüência e o tipo de contato sexual, o uso ou não de preservativos, o estado imunológico e a presença ou ausência de doenças sexualmente transmissíveis associadas. Vários estudos têm mostrado uma boa correlação entre carga viral no sangue periférico e carga viral em secreções cervicais e seminais.

A carga viral é o principal preditor do risco de transmissão heterossexual do HIV-1, e a transmissão é rara entre as pessoas com níveis de menos de 1500 cópias de RNA do HIV-1 por mililitro.

Após o tratamento, a carga viral nas secreções genitais cai em correspondência com o declínio da carga viral no sangue periférico. O risco residual não pode ser excluído cientificamente, mas é muito reduzido.

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