Os algoritmos de diagnóstico recomendados incluem métodos moleculares e sorológicos. São utilizados no diagnóstico de pacientes e na vigilância epidemiológica, laboratorial e permitem a consequente aplicação de ações de prevenção e controle. Podem ser adaptados para cada região e situação epidemiológica de forma dinâmica. Além disso, é importante integrar os resultados laboratoriais com as informações clínicas, epidemiológicas e ambientais para uma adequada caracterização da situação epidemiológica. As amostras devem ser acompanhadas de um conjunto mínimo de dados epidemiológicos e clínicos do paciente que subsidiem a seleção dos exames a serem realizados e a interpretação dos resultados.
Casos suspeitos de dengue, chikungunya e zika
– Testes virológicos – Métodos diretos
Os métodos virológicos permitem a identificação direta de vírus ou de um de seus componentes. Os principais métodos são a detecção de sequências genômicas, a detecção de antígenos e o isolamento, este, na maioria das infecções por arbovírus não é usado para o diagnóstico. De acordo com a apresentação clínica, o contexto epidemiológico e a disponibilidade de ensaios de RT-PCR multiplex, a detecção de DENV, CHIKV e ZIKV pode ser tentada sequencialmente ou em paralelo.
O processo de amplificação aumenta a sensibilidade dos testes moleculares. Esses testes também são altamente específicos, desde que a região do genoma viral amplificada mostre a diferença entre o vírus alvo e outros vírus geneticamente relacionados. No entanto, a sensibilidade dos testes moleculares depende do nível de RNA viral a ser detectado na amostra biológica e da dinâmica temporal desses níveis em relação ao início dos sintomas da doença. Existem vários exemplos de situações que afetam a sensibilidade da detecção molecular: diminuição na viremia DENV, CHIKV, ZIKV com o tempo
decorrido desde o início dos sintomas, menor viremia do ZIKV em comparação com DENV e CHIKV ou níveis mais altos de RNA de ZIKV na urina em comparação com o soro. É importante considerar que a data do início dos sintomas é informada pelo paciente e pode estar sujeito a vieses, especialmente na infecção por ZIKV, que geralmente causa poucos sintomas.
Assim, os resultados RT-PCR negativos podem ser causados por uma fase virêmica já concluída e, nesses casos, podem ser realizados os testes sorológicos. Finalmente, a qualidade da amostra é chave para garantir a sensibilidade dos testes moleculares. Conforme indicado na Figura 1, durante a fase aguda da infecção, o soro é a amostra preferencial para os testes usuais de RT-PCR de DENV, CHIKV e ZIKV. No entanto, urina e sangue total também podem ser usados para detecção de ZIKV na fase aguda. Enquanto ZIKV tipicamente mostra uma viremia curta e baixa, DENV e CHIKV podem ser detectados no soro
por até 7 e 8 dias, respectivamente.
Algoritmo para testes virológicos em casos suspeitos de dengue, chikungunya e zika
Durante a fase aguda, o antígeno DENV NS1 também pode ser usado (neste caso, apenas a amostra de soro é adequada). A proteína DENV NS1 é secretada por células infectadas e pode ser detectada no soro, tanto em indivíduos com infecção primária ou secundária. O período de detecção é maior nas infecções primárias (ou seja, a primeira infecção por DENV de uma pessoa) do que nas secundárias (infecções subsequentes por DENV) (Figura 2). Desta forma, a sensibilidade de detecção é mais baixa em infecções secundárias. Em geral, a concentração da proteína NS1 no soro diminui ao longo da infecção e, simultaneamente, a sensibilidade de detecção é reduzida. A sensibilidade da detecção de NS1 também varia entre os sorotipos de DENV. Como a detecção de antígenos virais depende do uso de anticorpos, dada a similaridade dos antígenos nas infecções virais dentro do mesmo gênero, é necessário levar em consideração a possibilidade de reatividade cruzada entre os testes, pois pode afetar sua especificidade.
– Testes sorológicos – Métodos indiretos
De acordo com o contexto epidemiológico, outros flavivírus além de DENV e ZIKV podem ser incluídos no diagnóstico diferencial. Na ausência de outros resultados laboratoriais, os testes positivos para mais de um flavivírus IgM são interpretados como uma infecção recente por flavivírus. Vale ressaltar que IgM também pode estar ausente ou abaixo dos limites de detecção em algumas infecções secundárias por flavivírus.
Os métodos sorológicos baseiam-se na detecção da resposta imune à infecção viral, em particular, anticorpos que são detectados principalmente no soro (LCR em casos de doença grave neurológica). A sensibilidade dos métodos sorológicos depende, sobretudo, da dinâmica temporal da produção de anticorpos, que foi bem caracterizada no caso de infecções por DENV. Na infecção primária, os anticorpos IgM anti-DENV aumentam gradualmente ao longo da primeira semana após o início dos sintomas, enquanto os anticorpos IgG podem ser detectados entre o quinto e o sétimo dia do início dos sintomas.
Em comparação, durante uma infecção secundária por DENV, os anticorpos IgG são produzidos mais cedo e atingem níveis mais altos, enquanto os níveis de anticorpos IgM são geralmente mais baixos do que na infecção primária. Os anticorpos IgM diminuem semanas a meses após a infecção, mas uma persistência mais longa também foi descrita, dependendo do vírus infectante. Os anticorpos IgG são de longa duração e podem ser detectados por toda a vida.
Cinética do vírus da dengue, proteína NS1 e anticorpos IgM e IgG em amostras de soro em infecções primárias e secundárias
A infecção pelo CHIKV não está incluída no algoritmo (figura 3), pois a sorologia do alfavírus mostra muito menos reatividade cruzada do que a sorologia de flavivírus. No entanto, dependendo do contexto epidemiológico, o diagnóstico diferencial com outros alfavírus pode ser necessário.
Algoritmo para testes sorológicos em casos suspeitos de dengue e zika
As técnicas sorológicas têm limitações. A primeira é que um resultado de teste positivo para IgM em uma única amostra é apenas presuntiva de infecção aguda, uma vez que os anticorpos detectados podem vir de uma infecção recente, não necessariamente causada pelo quadro agudo. No caso doenças para as quais existe vacina, os anticorpos detectados também podem vir de uma vacinação recente.
A persistência de anticorpos IgM ainda não foi totalmente caracterizada para infecções por DENV, CHIKV, ZIKV e febre amarela, e alguns dados sugerem que esses anticorpos podem persister por mais tempo do que se pensava inicialmente. No caso de anticorpos IgG, que persistem por mais tempo que os anticorpos IgM, sua detecção em uma única amostra apenas serve para uma interpretação provisória. Para confirmação laboratorial de infecção aguda é necessário ter amostras pareadas: uma da fase aguda (geralmente obtida na primeira semana após o início dos sintomas) e outra da fase de convalescença (idealmente obtida pelo menos duas semanas após a primeira). Soroconversão IgM (resultado negativo da amostra de fase aguda e positivo para convalescença) ou um aumento nos títulos de IgG ou anticorpos neutralizantes entre as duas amostras (aumento de 4 vezes ou mais nos títulos de anticorpos) confirmam infecção aguda. Entretanto, a confirmação do agente etiológico é limitada pela reatividade cruzada de testes sorológicos em infecções por vírus do mesmo gênero ou pela vacinação contra eles. A reatividade cruzada é mais comum nas infecções secundárias do que nas primárias;
portanto, em áreas onde vários flavivírus circulam simultaneamente ou já circularam, a probabilidade de reação cruzada é alta. Também foi observada reatividade cruzada entre diferentes alfavírus, embora não tenha sido caracterizada tão amplamente quanto nos flavivírus. Os testes diferenciais devem ser baseados na situação epidemiológica da área de residência ou exposição do caso em questão. Em geral, os testes de neutralização têm maior especificidade do que os de detecção de anticorpos IgM ou IgG. A reatividade cruzada entre flavivírus também foi documentada em testes de neutralização e testes diferenciais com um painel de flavivírus são recomendados. Como já indicado, especialmente em
infecções secundárias, pode ser possível determinar o flavivírus infectante, mesmo ao executar testes paralelos para vários vírus.
Uso e interpretação de métodos sorológicos
Apesar de suas limitações, os testes sorológicos fazem parte dos métodos diagnósticos de infecções por arbovírus por vários motivos:
1) o uso de métodos virológicos depende da disponibilidade de amostras de boa qualidade, obtidas em tempo hábil;
2) o paciente pode se apresentar para diagnóstico quando a fase virêmica passou;
3) os métodos virológicos nem sempre estão disponíveis, pois para eles são necessários áreas e equipamentos específicos no laboratório; além disso, os métodos sorológicos são muito mais baratos e fáceis para executar do que os virológicos e podem ser usados mais facilmente na rede de laboratórios locais;
4) a combinação de métodos virológicos e sorológicos pode melhorar a sensibilidade e especificidade do diagnóstico; e
5) métodos sorológicos são essenciais quando o vírus e seus componentes são encontrados com menor frequência nas amostras biológicas, como em recém-nascidos com síndrome congênita do zika ou em pacientes com síndromes neurológicas associadas à infecção pelo zika ZIKV ou outros arbovírus.
Quando apenas os resultados laboratoriais de testes sorológicos estão disponíveis, sua interpretação deve ser feita com cautela. Por exemplo, quando métodos sorológicos são aplicados em amostras únicas para vigilância de rotina de um determinado vírus, tendências observadas podem ser devido a um vírus diferente, embora do mesmo gênero, e os resultados devem ser interpretados como tal até que mais informações sejam obtidas. Profissionais de saúde e pacientes, por meio de orientação antes e depois do teste, devem conhecer essas limitações, evitando, assim, a má interpretação dos resultados. Além disso, é importante integrar os resultados laboratoriais com informações clínicas, epidemiológicas e ambientais para uma adequada caracterização da situação.
Devido às limitações dos métodos sorológicos mencionados, sempre que possível, deve-se dar prioridade aos métodos virológicos, especialmente métodos moleculares, com a devida consideração de custos e eficiência. Também seria necessário coletar e analisar amostras pareadas das fases aguda e convalescente para um subconjunto de casos. Esta abordagem pode facilitar a determinação do agente etiológico por sorologia. Por fim, na atual situação epidemiológica, em que circulam simultaneamente vários alfavírus e flavivírus, a análise com métodos sorológicos da resposta imune em amostras pareadas, juntamente com a detecção molecular da etiologia viral, muitas vezes podem ser necessários para a completa caracterização dos casos.
Referências
- Organización Panamericana de la Salud. Recomendaciones para la detección y el diagnóstico por laboratorio de infecciones por arbovirus en la Región de las Américas. Washington, D.C., 2022. https://doi.org/10.37774/9789275325872